Sangha
Virtual
Estudos Budistas
Tradição
do Ven. Thich Nhat Hanh
Aprendendo o amor verdadeiro
Muitas vezes pensamos em uma alma gêmea como uma pessoa fora de nós que nos conhece bem. Em vietnamita, a palavra "alma gêmea" é Tri Ky. Tri significa, "saber, lembrar, dominar." Ky significa "si mesmo". Então, uma alma gêmea é quem sabe, lembra e domina a si mesmo. Como a palavra "Tri Ky" implica, é importante lembrar que o verdadeiro amor - a alma gêmea que estamos sempre buscando – já está sempre presente dentro de nós. Se nós soubermos, lembrarmos, e dominarmos a nós mesmos, descobriremos quem somos, qual o significado da vida, e o que deveríamos estar fazendo aqui neste planeta Terra.
Como podemos aprender esse amor verdadeiro, para "saber, lembrar e dominar" a nós mesmos? Só podemos dominar algo se soubermos o que é, e praticarmos frequentemente. Em chinês, o caractere "mindfulness" significa literalmente "agora mente" e igualmente significa "recordar." A consciência tornou-se um chavão e uma moda hoje em dia. No entanto, a consciência na sua verdadeira essência é uma capacidade humana inerente. A prática e o cultivo diários da consciência fortalecem esta capacidade de ancorar a mente no momento presente, para que se lembre, saiba, e tome cuidado apropriado do corpo, sentimentos, pensamentos e percepções.
O Buda usou a imagem da lua para descrever a qualidade da consciência que é gentil, discreta, mas sempre abraça tudo. Quando a lua sobe no céu, sobe tão silenciosamente que é imperceptível. A maioria de nós não está ciente de que ela está subindo. Mesmo quando a lua já está lá em cima no meio do céu, a maioria de nós ainda não tem conhecimento disso. No entanto, quando ela ainda está no horizonte, já começa a espalhar a sua suave luz e a iluminar o ambiente. À medida que ascende mais, a sua luz se espalha mais e mais para os pomares de bambu, para a floresta, e para cada pequeno canto. Cada parte da vida está sendo iluminada pela lua e está refletindo o luar.
Esta suave, discreta, mas sempre inclusiva qualidade do luar pode ser vista na consciência. A consciência é algo suave, silencioso, gentil e discreto, mas, no entanto, tem a capacidade de abraçar todos os aspectos da nossa vida. Impregna todos os poros da nossa pele e cada parte do nosso ser. Quando estamos cientes de nossa respiração, nossos passos, ou uma gota de orvalho que está pendurada na ponta de uma folha, esta consciência é gentil e suave como o luar. No entanto, é sempre penetrante e nos traz uma certa qualidade de brilho e leveza. Sentimo-nos conectados àquela gota de orvalho, àquela folha, àquela inspiração e expiração, e a cada aspecto de nossa vida. Silenciosamente e lentamente, nos sentimos conectados à própria vida.
Assim, a prática de consciência permitiu-me cultivar e oferecer amor a mim mesma para que eu tenha algo a oferecer aos outros, e para que quando os outros ofereçam amor para mim, eu não rejeite por medo ou agarre por causa da solidão. O amor não deve ser baseado na necessidade ou no apego, mas de reciprocidade, compreensão, aceitação e confiança que oferecemos um ao outro. Só então o amor pode ser verdadeiro; Só então pode-se ter algo significativo, substancial e real para oferecer a si mesmo e aos outros.
Nós somos afortunados que o Buda nos deu quatro ensinamentos concretos sobre os componentes do amor verdadeiro, que chamou de “As Quatro Mentes Imensuráveis do Amor”, e que meu professor, mestre Zen Thich Nhat Hanh, também chama como "Os Elementos do Amor Verdadeiro." Estas são quatro capacidades e qualidades que são inatas em cada um de nós. Através da nossa prática de consciência, podemos cultivá-las e realizá-las plenamente.
A primeira das Quatro Mentes Imensuráveis do Amor de Buda é maitri, amizade. Isto vem da palavra em sânscrito, mitra, que significa literalmente "amigo". Toda vez que meu professor, carinhosamente conhecido como "Thay" (que significa "professor"), fala sobre As Quatro Mentes Imensuráveis do Amor de Buda, ele expressa o desejo de retraduzir seus nomes. Por exemplo, o primeiro elemento, maitri, foi traduzido como bondade amorosa, embora a palavra raiz, mitra, signifique amigo. Gostaria de explorar este elemento de verdadeiro amor e tentar traduzi-lo como amizade ou parentesco.
O segundo elemento do amor verdadeiro é karuna, que significa ajudar a aliviar e remover o sofrimento, seja em si mesmo ou em outra pessoa. Ele foi traduzido como "compaixão". Eu gostaria de explorar este elemento de amor verdadeiro e traduzi-lo como "a capacidade de curar" ou como "cura". Curar é tornar ou fazer algo saudável ou bom novamente. Assim, a cura pode ser vista como um processo de transformação e remoção do sofrimento, para que o bem-estar possa estar presente em nós mesmos, na nossa relação com nós mesmos, e com os outros.
O terceiro elemento do amor verdadeiro é mudita, geralmente traduzido como "alegria". Mudita pode ser a alegria que cultivamos em nós mesmos ou a alegria que oferecemos a outra pessoa. Quando estamos satisfeitos com a alegria que outra pessoa está experimentando, isso é conhecido como "alegria altruísta", se sentir feliz pelas condições vantajosas ou realizações de outra pessoa.
O quarto elemento do amor verdadeiro, upeksha, tem sido traduzido de forma variada como "deixar ir", "serenidade", "não discriminação", ou "inclusividade". Porque algumas pessoas podem associar os termos "serenidade" e "não discriminação" com igualdade de direitos, gênero e questões raciais, eu gostaria de usar a palavra "interser". Na verdade, interser engloba a serenidade, a não discriminação, a inclusão e o desapego.
Durante o Retiro de Inverno de 2011-12, Thay adicionou mais dois elementos às As Quatro Mentes Imensuráveis do Amor de Buda. Um é "confiança ". Entre as várias palavras em sânscrito para confiança, eu escolhi a palavra vishvas, que inclui não só os significados de confiança, mas também as consequências que esse elemento traz: respiração livre, liberdade de medo, conforto, encorajamento e inspiração.
O outro elemento do verdadeiro amor que Thay acrescentou é "reverência". Eu escolhi o termo sânscrito nyas para reverência ou respeito, porque a sua palavra-raiz, asyati ou asati, significa "colocar sobre a terra, virar ou ir em direção a algo, depositar, confiar ou comprometer-se, colocar na cabeça, receber com reverência, chamar à mente, refletir e ponderar. A reverência é uma capacidade de reconhecer e de estar maravilhado com o que existe.
(Do livro “Mindfulness as medicine”– Sister Dang Nghiem)
(Traduzido por Leonardo Dobbin)
Comente esse texto em http://sangavirtual.blogspot.com
Caso queira obter esse texto em formato PDF clique aqui