Sangha Virtual

 Estudos Budistas

Tradição do Ven. Thich Nhat Hanh

 

Avalokiteshvara

 

Bom dia queridos amigos, bem-vindos ao retiro de verão de Plum Village. Começaremos hoje com cânticos. Todos são convidados a participar da prática da escuta. Os monásticos vão cantar o nome de Avalokiteshvara. O nome de uma pessoa que sabe ouvir o sofrimento dentro de si e o sofrimento do mundo. Esta é uma prática muito profunda. Se você souber como voltar para si mesmo e ouvir o sofrimento interior, poderá obter a iluminação.

 

Compreensão e compaixão surgirão desse tipo de prática. Você entende seu sofrimento, entende o sofrimento de seu pai, da sua mãe, de seus ancestrais. Você entende o sofrimento de seu povo, de seu país. Entende o sofrimento da Terra, da nossa sociedade. Uma compreensão assim ajudará o amor e a compaixão a surgirem. Quando a compaixão surge, você sofre menos imediatamente. Há uma transformação e cura ocorrendo quando a compaixão nasce em seu coração.

 

Agora você pode olhar para a outra pessoa com compaixão. Você não sofre mais quando olha para ele ou ela. Porque pode ver o sofrimento nessa pessoa. Você não culpa, não está mais com raiva dele ou dela. Porque em seu coração já existe compaixão. Então, ao invés de tentar puni-la, você tem a intenção de fazer algo ou dizer algo para ajudar a outra pessoa a sofrer menos. Você pode ouvir essa pessoa com compaixão.

 

Você pode dizer coisas que podem ajudá-la a sofrer menos. Você pode fazer muitas coisas maravilhosas assim, só porque é capaz de entender seu próprio sofrimento. Compreendendo seu próprio sofrimento, você pode compreender o sofrimento da outra pessoa com muito mais facilidade.

 

Avalokita é o tipo de bodhisattva especializado em ouvir. Primeiro, ele volta a si mesmo e ouve o sofrimento dentro de si. Ao ouvir o sofrimento interior, ele pode compreender o sofrimento de seus pais, seus ancestrais e, ao mesmo tempo, pode compreender o sofrimento de outras pessoas na sociedade.

 

Esta é uma prática muito importante porque muitos de nós não queremos ouvir o nosso próprio sofrimento. É por isso que você não tem chance. Então, o canto de hoje é para tocar o sofrimento interior para que você possa permitir que a compaixão surja, para que você possa entender o sofrimento do mundo, de seus pais, de seus ancestrais.

 

Quando os monásticos cantam o nome Avalokitesvara pela primeira vez, eles voltam a si mesmos e tentam tocar o sofrimento dentro deles. Quando eles cantam e entoam o nome pela segunda vez, eles se conscientizam do sofrimento das pessoas ao seu redor. E quando eles cantam e cantam pela terceira vez, eles entram em contato com o sofrimento do mundo. Há muitos lugares no mundo onde as pessoas sofrem muito profundamente. Não só por causa da guerra, por causa da separação, das catástrofes naturais. Eles sofrem também por injustiça social ou repressão, por causa da violência. Eles sofrem por relacionamentos difíceis e assim por diante.

 

A prática de ouvir o sofrimento é dar uma chance para a compaixão surgir. Quando a compaixão surge, você se sente melhor, sofre menos. Pode acontecer muito rapidamente. Essa é a prática da atenção plena no sofrimento. Você está atento ao seu próprio sofrimento, está atento ao sofrimento da outra pessoa, está atento ao sofrimento do mundo. A atenção plena no sofrimento trará compaixão e compreensão. Então, quando nos sentamos e ouvimos, podemos fazer o mesmo.

 

Não temos que cantar em voz alta. Seguimos nossa inspiração e expiração, e voltamos para nós mesmos. Não temos medo de estar em contato com o sofrimento interior. Nós nos permitimos abraçar nosso próprio sofrimento. “Oh, minha querida dor, meu querido sofrimento, minha querida tristeza. Eu sei que você está aí. Não estou mais fugindo de você. Estou de volta para reconhecê-lo e abraçá-lo como abraçar um bebê.” É isso que praticamos. Vamos para casa [interior] e nos permitimos ser abraçados, permitimos que nosso sofrimento seja abraçado por nós mesmos. Nós cuidamos de nós mesmos.

 

Quando ouvimos o canto pela segunda vez, percebemos que as pessoas ao nosso redor também sofrem, então temos simpatia. Podemos nos comunicar com elas. Quando ouvimos o canto pela terceira vez, sabemos que no mundo as pessoas sofrem muito, e queremos estar em comunicação com elas. Queremos ser algo ou fazer algo para ajudar o mundo a sofrer menos.

 

A prática é permitir-nos estar aqui, para não ser levado pelo nosso pensamento. Porque se ficarmos sentados pensando, nosso pensamento nos levará a outro lugar. É por isso que é muito importante parar o pensamento. Apenas para focar nossa atenção no canto. Você está com o canto. Você está inspirando, expirando e fica com o canto. Portanto, há apenas a inspiração, a expiração e o canto, e nossa mente pode parar de pensar.

 

Apenas sentimos a energia, a energia coletiva da sangha, a energia da atenção plena, a energia da compaixão gerada pelo canto. Permitimos que nosso corpo relaxe e esteja aberto, para que a energia coletiva da sangha penetre em nosso corpo. Isto é muito importante. Não pensar, apenas sentir. Abrir nosso corpo e permitir que a energia da atenção plena e da compaixão penetre em nosso corpo. Podemos fazer isso.

 

Se pudermos fazer isso, alguns minutos depois haverá uma mudança. Nossa tensão, a tensão em nosso corpo, a dor em nosso corpo, desaparecerá. Porque permitimos que nosso corpo e nossa mente sejam abraçados pela energia coletiva da atenção plena, da compaixão, gerada pelo canto.

 

Cantar não é exatamente orar, não. Cantar é tocar o sofrimento para permitir que a compaixão e a compreensão surjam. Quando fizermos isso juntos, a energia coletiva de compaixão e atenção plena será grande. Se sentarmos e nos permitirmos ser abraçados por essa energia, sofreremos menos em poucos minutos. Há tensão e dor em nosso corpo. Se permitirmos que nosso corpo seja abraçado pela energia da atenção plena e da compaixão, poderemos liberar a tensão e reduzir a dor com muita facilidade em apenas alguns minutos e nos sentiremos muito melhor depois.

 

Ouvir, sentir e não pensar. Se tiver alguma dor e alguma tristeza ou raiva ou medo em seu coração, tente abrir seu coração para que a energia da sangha possa penetrar em seu coração. Não guarde para você. Abra e permita que a energia da sangha penetre e ajude a abraçar a dor e a tristeza, o medo, a raiva em você. “Querida sangha, estou aqui. Tenho dor, sofrimento, medo desespero em mim. Por favor, ajude a abraçar esses blocos de dor em mim.” Eu me confio à sangha.

 

Se você puder abrir seu coração e permitir que a energia da sangha penetre e abrace sua dor e sua tristeza, você se sentirá melhor depois de alguns minutos ouvindo. A energia do sofrimento, do medo, da raiva, é abraçada pela energia da atenção plena e da compaixão e a transmissão pode acontecer. Se você permitir que seu sofrimento, seu medo, sua raiva sejam abraçados pela sangha, a transformação e a cura serão possíveis durante o tempo da prática.

 

Se temos alguém muito próximo de nós em casa que não pôde vir ao retiro, e essa pessoa sofre profundamente, podemos muito bem enviar essa energia para ele ou para ela, aqui e agora. Nós apenas pensamos nessa pessoa. ou chamamos seu nome silenciosamente em nossa mente. E então esta energia gerada pela prática será canalizada para aquela pessoa nesta manhã. Em casa essa pessoa pode se sentir melhor.

 

Avalokitesvara é uma pessoa que sabe ouvir o sofrimento interior e exterior. Ele obteve transformação e cura por causa dessa prática. Então vamos praticar como ele, o bodhisattva da escuta profunda, o bodhisattva da escuta compassiva. Sentimos que o bodhisattva está em nós, não está fora de nós, está em nós. Ele está em nós. Porque nós também temos a capacidade de ouvir o nosso próprio sofrimento e o sofrimento do mundo.

 

(Palestra de Dharma de Thich Nhat Hanh em 7 de julho de 2012 – transcrito do vídeo do YouTube

https://youtu.be/XrlDidcZ4Go)

Traduzido por Leonardo Dobbin)

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