Sangha
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Estudos Budistas
Tradição
do Ven. Thich Nhat Hanh
Os elementos do amor verdadeiro
Na tradição budista nós falamos de amor em termos de amor verdadeiro, em termos de bondade amorosa, compaixão, alegria, e equanimidade ou não-discriminação e a inclusividade. Para entender realmente a compaixão, você precisa também entender os outros três elementos do amor genuíno.
O primeiro elemento do amor verdadeiro é a bondade amorosa. Ela tem o poder de oferecer felicidade. Se o amor não é capaz de oferecer felicidade, então não é amor genuíno. Seu amor verdadeiro deve oferecer felicidade a você e a ele, e a ela, felicidade. Não se trata da disposição de oferecer felicidade. Pois se você não entende a outra pessoa, quanto mais você tentar fazê-la feliz, mais você vai fazê-la sofrer.
Você precisa entender ele ou ela, seus sofrimentos e necessidades antes de você poder praticar a bondade amorosa. Na Ásia há uma fruta chamada durian, muitas pessoas adoram. mas para mim, eu não posso comê-la. Então você diz: "querido Thay, você deveria comer um pouco de durian", então você me faz sofrer, por me amar. Nós devemos entender a outra pessoa para podermos de verdade fazê-la feliz. É por isso que 'entender' é outra palavra para amor, para compaixão.
É por isso que devemos perguntar para nossos parceiros: “Querida, você acha que eu te entendo o bastante?" "Se eu não te entendo o bastante, por favor, me ajude!" Então a bondade amorosa não é só a vontade de fazer uma pessoa feliz, mas a capacidade de fazê-la feliz. Isso requer entendimento, e o entendimento requer tempo para olhar profundamente.
O segundo elemento é a compaixão, que é 'karuṇā'. A grande compaixão é chamada de 'mahākaruṇā'. A compaixão tem o poder de remover a dor e o sofrimento. Se o seu amor não faz a outra pessoa sofrer menos, então ele não é o amor genuíno. Você tem de entender o sofrimento dele, o desespero dela, para poder ajudá-lo ou ajudá-la a sofrer menos. É por isso que você precisa ter o tempo para olhar e para ouvir, e a compreensão vai criar o amor e a felicidade.
A prática é aplicar isso com você mesmo. Você tem que estar apto a se oferecer felicidade, e compaixão. Temos compaixão suficiente com nosso próprio corpo? Com nossos sentimentos? Sabemos como lidar com nosso corpo para fazê-lo sofrer menos? Sabemos como lidar com nossos sentimentos para acalmar nossas emoções? Isso é amor-próprio. A capacidade de amar outra pessoa depende inteiramente da capacidade de amarmos a nós mesmos, e de ter cuidado com nós mesmos. Isto é verdade com a compaixão.
O terceiro elemento é a alegria. 'Mudita'. Se te amar faz a outra pessoa chorar todos os dias, isso não é o amor genuíno. Então você cria a alegria. Para você mesmo e para a outra pessoa. Há muitas maneiras práticas para criar alegria, sem ter que ir ao mercado e comprar alguma coisa, para dar pra ele ou pra ela.
Você respira conscientemente, trazendo sua mente para o seu corpo, você se sente revigorado e agradável e você vai até a pessoa e diz “Querida, sabe de uma coisa? Eu estou aqui para você.” Como você pode amar se você não está presente? Amar significa estar presente. Estar presente pela pessoa que você ama.
Se você está tão ocupado no seu trabalho e tão ocupado ganhando dinheiro, você não tem tempo para você mesmo e para a sua pessoa amada. É por isso que é preciso respirar consciente, caminhar consciente, para trazer sua mente para seu corpo, e para se sentir relaxado, revigorado e amável, e para pronunciar o mantra “Querida, eu estou aqui pra você.” Isto é trazer a alegria para você e para a outra pessoa.
Quando você está realmente presente, e oferece sua presença para ele ou para ela, você tem a oportunidade de reconhecer a presença da outra pessoa como algo muito precioso para você. Então você pode repetir o segundo mantra: “Querida(o), eu sei que você está aí, e eu estou tão feliz.” Ser amado significa ser reconhecido como um ser existente.
Você está dirigindo seu carro pensando em inúmeras coisas, exceto na pessoa que está sentada bem ao seu lado, ela não pode estar feliz de maneira nenhuma. Então, enquanto estiver dirigindo use sua plena consciência e diga: “Querida, sabe de uma coisa? Eu sei que você está aí bem ao meu lado, e eu estou muito feliz!"
São práticas simples de plena consciência como essas que podem trazer a alegria. Se ele está no escritório você pode praticar o mantra através do telefone, ou mandar um e-mail para ele dizendo: “Querido, eu sei que você está aí, e eu estou muito feliz.” E é por isso que criar a alegria faz parte do amor genuíno.
O quarto elemento é a inclusividade. Nós não podemos entender a compaixão, profundamente, sem entender o quarto elemento do amor genuíno. No amor verdadeiro não há mais discriminação entre o que ama e o que é amado. Você não pode dizer “Querida, isso é problema seu.” No amor verdadeiro o meu problema é o seu problema. A minha felicidade é a sua felicidade. O meu sofrimento é o seu sofrimento. Não há mais fronteiras. No amor verdadeiro a felicidade e o sofrimento não são mais questões individuais e se você continua a amar dessa maneira, você começa a incluir todos nós no seu amor genuíno.
Os quatro elementos do amor verdadeiro também são chamados de as quatro mentes ilimitadas. Eles nunca serão excessivos. Você começa com uma pessoa, e então se você seguir o caminho do verdadeiro amor, seu coração vai abrir, abrir, e abrir, até que você inclua todos nós nele. Isso é o amor genuíno, é o tipo de amor que pode engrandecer o seu coração sem nunca parar.
Um dia o Buda estava segurando uma tigela de água com a sua mão esquerda e com a mão direita um punhado de sal. Ele jogou o sal na água e misturou. Então ele perguntou aos monges: “Meus queridos amigos vocês acham que podem beber essa água? Está tão salgada." Mas se você jogar essa quantidade de água em um grande rio, não vai fazer a água do rio ficar salgada de forma alguma, e milhares de pessoas vão continuar a beber a água do rio.
O mesmo acontece com alguém com um grande coração, um coração bom e cheio de compaixão, ele não sofre mais. As coisas que fazem as outras pessoas sofrerem não o fazem sofrer. É como um punhado de sal, que pode salgar uma tigela de água, mas que não é capaz de fazer o grande rio salgado, de maneira alguma.”
Então, os quatro 'brahmavihārā', os quatro elementos do amor verdadeiro são ilimitados. Porque amar dessa maneira vai fazer com que um dia você inclua todos os seres em seu coração. Você não ama somente humanos, mas animais, plantas e minerais. Os minerais também estão vivos e os minerais também podem sofrer. Esse é o amor que é recomendado pelo Buda, o amor sem fronteiras, sem discriminação.
O quarto elemento do amor verdadeiro é a inclusividade, sem discriminação, de qualquer forma. Preto ou branco, norte ou sul, rico ou pobre, todos estão ao alcance do seu amor. Quando você tem esse tipo de amor você não sofre mais. Você está numa situação de ajudar muitas pessoas. É por isso que todos nós que queremos ser úteis para a sociedade, devemos cultivar o amor genuíno. Com o amor verdadeiro nós somos nutridos, somos fortes o bastante. Se soubermos como construir uma comunidade de amor, uma comunidade de amor e de compaixão, então teremos o poder suficiente para fazer as mudanças na nossa sociedade.
(Palestra de Dharma de Thich Nhat Hanh – transcrito do vídeo do YouTube
https://youtu.be/ACcsYSCrPkk)
A transcrição da fala do vídeo foi feita por Marcos Bauch, tradução e revisão das legendas por Marcos Bauch e Luís Oliveira.)
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