Sangha
Virtual
Estudos Budistas
Tradição
do Ven. Thich Nhat Hanh
Os oito aspectos do caminho
Quando pediram ao Buda para descrever seu despertar e o modo de chegar ao despertar, ele ofereceu o Nobre Caminho Óctuplo. Muitos já ouviram falar sobre o Nobre Caminho Óctuplo várias vezes; é um dos ensinamentos e práticas centrais do budismo. O Nobre Caminho Óctuplo é uma maneira de gerar o despertar, bem como a manifestação concreta do despertar.
Se você perceber profundamente o que te traz alegria e paz e o que leva aos outros alegria e paz, em seguida, uma visão se desenvolverá e uma transformação começará a ocorrer naturalmente em seu ser. Não há nenhuma luta aqui. Torna-se natural para você andar sobre o Nobre Caminho Óctuplo; é o comportamento espontâneo do despertar.
A totalidade dos ensinamentos do Buda gira em torno das Quatro Nobres Verdades e do Nobre Caminho Óctuplo. Toda a miríade de ensinamentos são elaborações de aspectos desses ensinamentos centrais.
1. Compreensão Correta
O primeiro dos passos do Nobre Caminho Óctuplo é a Compreensão Correta, entender as coisas como elas são: entender como aplicar um ensinamento, colocando-o em prática em nossa vida diária.
Tudo começa com entender claramente. Isto é muito sutil. Ao longo de toda a nossa vida, nossa compreensão e conhecimento estarão crescendo e mudando. A compreensão que temos neste momento no tempo não é a verdade completa, absoluta. Compreensão não é algo estático; está sempre crescendo e mudando, se permitirmos isso.
Eu nunca vou esquecer Thay compartilhando em 1997 que se daqui a 20 anos estivermos fazendo a mesma coisa que estamos fazendo hoje, então nós teremos falhado. Da mesma forma a compreensão que temos hoje não será a mesma que teremos amanhã: será diferente se estivemos crescendo e estivermos nos desenvolvendo no caminho. Isso pode ser um pouco assustador para alguns de nós, uma vez que para crescer na Compreensão Correta significa estar disposto a deixar ir os nossos pontos de vista, nossos lugares confortáveis e dar constantemente um passo à frente em um novo território.
2. Intenção Correta
O segundo aspecto do Caminho Óctuplo é a Intenção Correta ou Desejo Correto ou também Pensamento Correto. Nós exploramos essa etapa em termos de ter a motivação certa: olhar para a energia que nos move para a frente. Tornando-nos mais conscientes e conhecedores das motivações sutis e outras, que trazemos para ações diferentes, situações diferentes, diferentes encontros, em nossa vida diária, nos tornamos mais hábeis no desenvolvimento de uma boa e saudável motivação. Eu também acho que é importante examinar as nossas motivações no que se refere a prática: por que somos praticantes?
3. Fala Correta
O terceiro passo é a Fala Correta: palavras que são oportunas, palavras que trazem alegria, autoconfiança e esperança, palavras que comunicam o que é verdadeiro — pelo menos o melhor de nosso conhecimento neste momento e que construa em vez de destruir. Muito da nossa comunicação não é realmente uma comunicação. Está só preenchendo o espaço vazio.
O Buda descreveu cinquenta e dois tipos de conversas inúteis; não é exatamente fala errada, mas fala pouco lucrativa. Há uma lista — na verdade, a maioria das conversas que temos todos os dias se encaixam em pelo menos uma — e geralmente umas três ou quatro — das categorias.
Apesar de interessantes, estes temas não são realmente propícios para desenvolver a mente de libertação. Ao olhar para a Fala Correta em nossas vidas, considere a forma como usamos nossa energia da fala e para que usamos nossas palavras.
Nosso mundo está se tornando cada vez mais interligado e nestes dias, nossas palavras podem viajar para muito longe e para o futuro também. Esta consciência pode ser uma lembrança maravilhosa, um grande sino de atenção plena para nós, para nos tornarmos mais proativos na hora de escolher o tipo de comunicação que oferecemos aos outros.
Também estaremos cientes da pessoa com quem estamos falando e da sua situação porque o tipo de comunicação que oferecemos em uma situação não é muito frequentemente o estilo certo de comunicação para outra situação ou pessoa.
Esta é uma coisa maravilhosa sobre a prática da meditação: é sempre um caminho de descoberta.
4. Ação Correta
O próximo passo do Nobre Caminho Óctuplo é descrito como a Ação Correta. Em outro texto aprendemos sobre o bodhisattva Samantabhadra, o Bodhisattva da Grande Ação e como trazer esta energia para nossas vidas ao saber quando é o momento certo para fazer alguma coisa, sabendo como podemos nos beneficiar e aos outros.
Eu tenho que dizer que saber o que não precisamos fazer é provavelmente um dos aspectos mais importantes para considerarmos e investigarmos. Estamos sempre ocupados e cada minuto de nossa vida é capturado em todos esses projetos diferentes que pensamos serem tão importantes. Daqui a um ano, não conseguiremos lembrar o que são. Nós parecemos estar famintos de tempo. Nós valorizamos estar ocupados em nossa cultura: valorizamos aqueles cujo tempo está completamente cheio.
Não valorizamos a preguiça tanto quanto deveríamos. Muitas vezes, eu brinco com meus amigos que acho que nossa cultura poderia ser completamente transformada, se nós instituíssemos o cochilo, como em alguns países ao redor do mundo que praticam a arte de tirar uma sesta à tarde. Como seria se aqui na América do Norte, tudo se desligasse das 12h às duas da tarde, e as pessoas tivessem um longo almoço, descansássemos um pouco e depois voltássemos a trabalhar? É interessante pensar sobre isso, não é?
Também acho que é incrivelmente desafiador saber qual a ação correta em toda situação. Acho que é definitivamente verdade no meu próprio caso Eu já olhei para trás em situações que estive envolvido, e, apesar de na época ter feito o que pensei ser o melhor, mais tarde pensei, "Oh, talvez eu devesse ter feito isso de forma diferente", ou "Se eu tivesse interagido desta forma, talvez a situação fosse diferente agora."
O melhor que podemos fazer em qualquer situação, a maneira de realmente certificarmos que estamos em direção à ação correta, é examinar nossa motivação — voltar para nós mesmos e nos conectarmos com a nossa motivação de querermos ser benéficos, de qualquer modo que isso possa manifestar-se. É a única coisa que podemos fazer, mas se somos capazes de fazer isso, estou bem confiante que nos engajaremos na ação correta — ação que está em alinhamento com a nossa mais profunda aspiração.
5. Meio de Vida Correto
O próximo passo é o Meio de Vida Correto, que é definido como o modo de vida que não traz danos a si mesmo ou aos outros. Outros aqui são as outras pessoas, animais, plantas e a natureza em geral. O Modo de Vida Correto, como é descrito em nossos Treinamentos da Atenção Plena é um modo de vida "que ajuda a realizar o nosso ideal de compaixão e ação compassiva".
Agora precisamos florescer onde plantamos, então não há nenhuma razão por que nós não possamos nos tornar um bodisatva bem no meio de onde estamos agora. Não há nenhuma razão por que o nosso cubículo no meio de cem outros cubículos não possa tornar-se uma terra pura, um oásis de paz. Em nossas vidas, nem sempre podemos escolher a nossa situação, mas nós temos a escolha de como reagir. Como é que seu trabalho pode ser uma manifestação de sua profunda aspiração? Essa é uma pergunta para cada um de nós investigar.
6. O Esforço Correto
O próximo dos passos do Nobre Caminho Óctuplo é o Esforço Correto. Esforço Correto já foi mencionado várias vezes. Não te parece que o esforço correto é algo bastante central para o caminho budista? Isto é colocar algum esforço, não no sentido de trabalho duro, mas no sentido de alguém que está cultivando o seu coração.
Temos muita sorte aqui em Deer Park (monastério budista na Califórnia) porque temos amigos que vem e nos ajudam a cuidar das plantas nativas. Algumas plantas florescem em algumas estações, algumas florescem em outras e estes amigos sabem como ser pacientes para criar as boas condições para as diferentes plantas. Acontece da mesma forma com a nossa própria vida de prática. Precisamos saber que tipo de esforço estender a diferentes áreas da nossa vida, para não fazer dela uma luta, para não ter uma situação onde estamos rangendo os dentes e lutando, mas sim para criar boas condições para as qualidades maravilhosas que todos temos, as qualidades que nascem do entendimento e as qualidades que nascem da mente do amor, que se manifestam em nosso coração e em nossa vida.
7. Plena Atenção Correta
O próximo passo é a Plena Atenção Correta. Plena Atenção (mindfulness) pode ser plena atenção correta, ou pode ser plena atenção errada, ou plena atenção ainda não saudável. Eis porque o Buda nos ensina tão fortemente sobre a importância da yoniso manaskara ou desenvolver a atenção apropriada, aprender a focalizar nossa atenção sobre o que está em alinhamento com nossa aspiração mais profunda. Às vezes somos capturados e regamos elementos da consciência que não são úteis para o tipo de qualidades que queremos manifestar para nós e para o mundo.
8. Concentração Correta
O oitavo passo é a Concentração Correta. Concentração aqui não é concentração intelectual que só te deixa cansado. Concentração na meditação budista é habitar com alguma coisa; nossa mente está assentada e pode descansar em um ponto. Não há nenhuma luta. É como sentar-se sob a sombra de uma árvore num dia escaldante.
(Do livro “Nothing To It: Ten Ways to Be at Home with Yourself”)
Phap Hai é professor de Dharma e o monge sênior da tradição de Plum Village)
(Traduzido por Leonardo Dobbin)
Caso queira obter esse texto em formato PDF clique aqui