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Tradição
do Ven. Thich Nhat Hanh
As Seis Perfeições (Paramitas) – parte 1
As seis paramitas são ensinamentos do Budismo Mahayana. Paramita é uma palavra que pode ser traduzida como "perfeição" ou "realização perfeita". O ideograma chinês para este termo significa "atravessar para a outra margem", que é a margem da coragem, da paz e da libertação. As perfeições devem ser praticadas em nossa vida diária. Estamos atualmente na margem do sofrimento, da raiva e da depressão, e queremos atravessar para a margem do bem-estar. Para atravessar, é preciso fazer alguma coisa, e é a isso que chamamos de perfeição. Assim, voltamos para nós mesmos, praticamos a respiração consciente e olhando nosso sofrimento, nossa raiva, nossa depressão, e sorrimos. Ao fazer isso, superamos a dor e atravessamos. Devemos praticar as "perfeições" todos os dias.
Todas as vezes que damos um passo consciente, temos a oportunidade de sair da terra da tristeza para a terra da alegria. A Terra Pura está disponível aqui e agora. O Reino de Deus é uma semente dentro de nós. Se soubermos plantar essa semente em um bom solo, ela se tornará uma árvore, onde os pássaros virão se refugiar. Pratiquem a travessia para a outra margem sempre que sentirem necessidade. O Buda disse: "Não fique esperando que a outra margem venha até você. Se quiser atravessar para chegar à margem da segurança, do bem-estar, da coragem e da ausência de raiva, terá que nadar ou remar. Você precisa fazer um esforço." Esse esforço é a prática das Seis Perfeições.
(1) Dana paramita - Doação, generosidade, oferta.
(2) Shila paramita - Os preceitos ou treinamentos da atenção plena.
(3) Kshanti paramita - Tolerância, a capacidade de acolher, suportar e transformar a dor infligida a você por seus inimigos e também pelas pessoas que o amam.
(4) Virya pammita - O esforço, energia, perseverança.
(5) Dhyana paramita - A meditação.
(6) Prajna paramita - A sabedoria, compreensão, insight.
Praticar as seis perfeições ajuda a atingir a outra margem - a margem da liberdade, da harmonia e dos bons relacionamentos.
A primeira prática da travessia é a perfeição da generosidade (a dana paramita). Dar significa, primeiro, oferecer alegria, felicidade e amor. Existe uma planta, muito conhecida na Ásia - um membro da família das cebolas, que fica deliciosa nas sopas, no arroz frito e nos omeletes - que a cada vez que a cortamos torna a crescer em vinte e quatro horas. E quanto mais se corta essa planta, maior e mais forte ela cresce. A planta representa a dana paramita. Não guardamos nada para nós. Apenas queremos dar. Talvez a outra pessoa se sinta feliz com isso, mas com certeza os maiores beneficiados seremos nós mesmos. Em diversas histórias sobre as vidas passadas de Buda, nós o encontramos praticando a perfeição da generosidade.
A maior dádiva que podemos dar a alguém é nossa presença verdadeira. Um menino que conheço ouviu de seu pai: "O que você quer de aniversário?" O menino hesitou. O pai era rico e podia lhe dar o que pedisse. Mas passava tanto tempo ganhando dinheiro que quase nunca estava com a família. Por isso, o menino respondeu: "Pai, eu quero você!" A mensagem era clara. Se amamos alguém, temos que ofertar nossa presença verdadeira a essa pessoa. Quando damos esse presente, recebemos ao mesmo tempo o presente da alegria. Aprenda a oferecer sua presença verdadeira através da meditação. Inspirando conscientemente, promova a união do corpo e da mente. "Querido, estou aqui para você" é um mantra a ser repetido quando praticar essa perfeição.
O que mais podemos oferecer? Nossa estabilidade. "Inspirando, eu sou uma montanha. Expirando, eu me sinto firme." A pessoa que amamos necessita de que sejamos firmes e estáveis. Podemos cultivar nossa estabilidade através da inspiração e da expiração, da caminhada com atenção plena, da meditação sentada, e também gostando de viver profundamente cada momento. A firmeza é uma das características do Nirvana.
O que mais podemos oferecer? Nossa liberdade. A felicidade não é possível, a menos que estejamos livres de aflições tais como desejo, raiva, ciúme, medo, ou percepções errôneas. A liberdade é uma das características do Nirvana. Alguns tipos de felicidade são realmente destrutivos para o corpo, a mente e os relacionamentos. Estar livre de desejos é uma prática importante. Contemple profundamente a natureza daquilo que você acha que vai lhe proporcionar felicidade e pense se, de fato, isso pode implicar sofrimento para aqueles que ama. É preciso ter certeza disso se queremos ser realmente livres. Volte-se para o momento presente, e desfrute as maravilhas da vida que estão disponíveis. Existem tantas coisas saudáveis capazes de nos proporcionar felicidade, como por exemplo um lindo nascer do sol, o céu azul, montanhas, rios, e os rostos felizes das pessoas que nos cercam.
O que mais podemos oferecer? Nosso frescor. "Inspirando, eu me vejo como uma flor. Expirando, eu me sinto com o frescor." Podemos inspirar e expirar três vezes para restaurar a flor dentro de nós. É um grande presente!
O que mais podemos oferecer? Paz. É maravilhoso sentar-se ao lado de alguém que esteja em paz. Nós nos beneficiamos com a sua paz. "Inspirando, eu sou a água calma. Expirando, reflito as coisas como elas são." Podemos oferecer nossa paz e nossa lucidez para aqueles que amamos.
O que mais podemos oferecer? Espaço. A pessoa amada precisa de espaço para ser feliz. Em um arranjo de flores, cada flor precisa de espaço ao seu redor para poder irradiar sua verdadeira beleza. As pessoas são como flores. Sem espaço interno e externo elas não podem ser felizes. Não podemos comprar este tipo de presente na loja. Temos que produzi-lo através da prática. E quanto mais dermos, mais teremos. Quando a pessoa que amamos está feliz, esta felicidade retoma para nós imediatamente. Nós damos algo a essa pessoa, mas na verdade estamos dando a nós mesmos.
Dar é uma prática maravilhosa. O Buda disse que quando se está zangado com alguém, a ponto de tentar de tudo e ainda continuar zangado, devemos praticar a perfeição da generosidade. Quando estamos com raiva, nossa tendência é punir a outra pessoa. Mas ao fazer isso só aumentamos nosso sofrimento. O Buda propôs que, em vez disso, mandássemos um presente para a pessoa que é motivo de nossa raiva. Quando estamos com muita raiva, não temos a menor vontade de sair e comprar um presente, por isso temos que preparar esse presente enquanto não estamos zangados. A seguir, quando tudo o mais falhar, devemos sair e enviar o presente para a pessoa. Constataremos, para nosso espanto, que logo estamos nos sentindo melhor. A mesma coisa é verdade no caso dos países. Para que Israel tenha paz e. segurança, os israelenses precisam achar formas de assegurar a paz e a segurança dos palestinos. E para que os palestinos tenham paz e segurança, eles também precisam encontrar maneiras de assegurar a paz e a segurança dos israelenses. Você recebe aquilo que dá. Em vez de tentar punir a outra pessoa, ofereça exatamente aquilo de que a pessoa necessita. A prática da doação pode conduzir rapidamente ao bem-estar.
Quando alguém nos faz sofrer, é porque essa pessoa sofre profundamente dentro de si mesma, e seu sofrimento está se esparramando do lado de fora. Esta pessoa não precisa de mais sofrimento, precisa de ajuda. Essa é a mensagem que está sendo enviada. Se você conseguir entender isso, ofereça o que a pessoa precisa - alívio. Felicidade e segurança não são questões individuais. A felicidade e a segurança do outro são fundamentais para a sua felicidade e a sua segurança. Deseje o bem do outro com sinceridade, para que você também fique bem.
O que mais podemos oferecer? Compreensão. A compreensão é a flor da prática. Focalize sua atenção concentrada em um objeto, observe profundamente o objeto, e você terá insight e compreensão. Ao oferecer compreensão aos outros, eles deixarão imediatamente de sofrer.
A primeira pétala da flor das perfeições é a prática da generosidade. Recebemos aquilo que damos, muito mais depressa do que os sinais enviados por satélite. Quer você dê sua presença, sua estabilidade, seu frescor, sua firmeza, sua liberdade, ou sua compreensão, sua dádiva fará milagres. A generosidade é a prática do amor.
A segunda prática é o aperfeiçoamento dos preceitos, ou treinamentos da atenção plena. Os Cinco Treinamentos da Atenção Plena ajudam a proteger o corpo, a mente, a família e a sociedade. O Primeiro Treinamento da Atenção Plena versa sobre proteger as vidas dos seres humanos, animais, vegetais e minerais. Proteger outros seres significa proteger a nós mesmos. O segundo treinamento versa sobre impedir a exploração de seres humanos, de outros seres vivos e da natureza. Relaciona-se com a prática da generosidade. O terceiro tem a ver com proteger crianças e adultos do abuso sexual, e preservar a felicidade dos indivíduos e das famílias. Muitas famílias já foram separadas devido à má conduta sexual. Quando praticamos o Terceiro Treinamento da Atenção Plena, protegemos a nós mesmos, as famílias e os casais, porque ajudamos os outros a se sentirem seguros. O Quarto Treinamento da Atenção Plena versa sobre praticar a fala amorosa e a escuta atenciosa. O Quinto Treinamento da Atenção Plena é sobre consumir de maneira consciente.
A prática dos Cinco Treinamentos da Atenção Plena é uma forma de amor e de doação. Assegura a boa saúde e a proteção da nossa família e da sociedade. Shila paramita é uma grande dádiva que oferecemos à sociedade, à família e àqueles a quem amamos. A maior dádiva que podemos ofertar aos outros é praticar os Cinco Treinamentos da Atenção Plena. Se vivermos de acordo com eles, estaremos protegendo a nós mesmos e as pessoas que amamos. Quando praticamos shila paramita, oferecemos o precioso presente da vida.
Vamos contemplar juntos as causas de nosso sofrimento, seja ele individual ou coletivo. Se fizermos isso, veremos que os Cinco Treinamentos da Atenção Plena são o remédio necessário para a doença de nossa época. Todas as tradições têm o equivalente aos Cinco Treinamentos da Atenção Plena. Cada vez que vejo alguém receber e praticar os Cinco Treinamentos da Atenção Plena, fico feliz - pela pessoa, por sua família e por mim mesmo - porque sei que essa é a forma mais objetiva possível de se ter consciência de tudo o que ocorre. Precisamos de uma Sangha ao nosso redor para poder praticar com profundidade.
(Do livro “A essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh)
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