Sangha
Virtual
Estudos Budistas
Tradição
do Ven. Thich Nhat Hanh
Sexto mantra
Quando estamos sentados, podemos olhar profundamente para nós mesmos e ver que não somos um eu. Somos uma continuação, uma continuação de nossa mãe ou pai. Não somos completamente nosso pai ou nossa mãe, mas somos a continuação deles. Nós também continuamos nossos ancestrais e avós. Somos um fluxo contínuo de nossos ancestrais, parentes, pais, avós. Eles continuam dentro de nós. Vemos que somos um fluxo contínuo e quando somos capazes de ver isso, podemos fugir da ideia de eu. Assim nós não somos perturbados pelos sofrimentos que nos causam dor.
Existem esses complexos: complexo de igualdade, complexo de ser melhor que os outros e complexo de ser pior que os outros. Vivemos na sangha, se temos felicidade ou não depende de sermos capazes de ver isso. Se nos aceitamos e vemos quem somos, podemos aceitar as outras pessoas e ver quem elas são. Mas se não podemos nos aceitar, não poderemos aceitar os outros.
Existem pessoas que não conseguem se aceitar. Elas têm o complexo de inferioridade, ficam com raiva de si mesmas. Se não podemos nos aceitar, como poderemos aceitar os outros? Se não nos aceitamos quando vivemos juntos, não há felicidade. A felicidade na sangha é baseada na prática da aceitação.
Temos que começar assim, “Eu me aceito como sou, sou um fluxo, um fluxo contínuo. Como meus avós, antepassados são assim, é por isso que sou assim. Aceito plenamente que em mim existem talentos, em mim existem fraquezas. Eu aceito os talentos e fraquezas em mim.”
Dizer isso não significa que eu seja impotente. Através da minha prática, posso desenvolver esses talentos. Através da prática, posso transformar aos poucos essas fraquezas. Então essas duas coisas andem juntas. Por um lado, aceitando a herança deixada pelos ancestrais, aceitando o fluxo contínuo, por outro lado há um sonho, uma aspiração de fazer melhor. Essa aceitação e esse sonho vão juntos.
Quando uma pessoa olha para nós e nos elogia, ou nos critica, se tivermos esse insight não sofreremos, porque quando olhamos para nós mesmos poderemos ver os pontos bons e os pontos negativos. Com certeza existem os talentos e as fraquezas, todo mundo tem. Aqueles talentos e fraquezas não pertencem só a você. São todos herança, foram transmitidos, assim como um rio. O rio é assim porque todos os afluentes menores que vão para o rio são assim. Temos que aceitar tudo isso e essa aceitação nos traz paz. Temos que aceitar que temos esses méritos, talentos e fraquezas. É muito importante.
Quando alguém diz por exemplo, "você é tão bom". Temos que saber como reagir de uma maneira que está de acordo com o dharma. Podemos dizer “o que você diz está parcialmente certo porque em mim existem esses aspectos positivos, mas lembre também que existem fraquezas em mim, o que você diz, seu elogio, está apenas parcialmente certo.” É por isso que podemos escapar desse complexo de superioridade, ou ser melhor do que os outros.
Se não tivermos esse insight e as pessoas continuarem nos elogiando, pensaremos que somos Deus. Quando alguém elogia você, por dentro, temos que dizer "você está parcialmente certo, eu tenho alguns pontos positivos como esse, mas você não sabe que eu também tenho outros aspectos negativos." Não dizemos isso, mas temos que pensar. Se alguém elogia temos que dizer “você está parcialmente certo porque você não viu meus aspectos negativos.” Assim podemos manter nossa humildade e não empinamos nosso nariz e não nos corrompemos.
Por exemplo, alguém chega e critica você, "Você é um inútil, você é alguém com muitas fraquezas." Da mesma forma, podemos dizer que essa pessoa só tem razão em parte. “Eu também tenho alguns pontos e talentos bons.” Nessa hora podemos responder com nossas palavras ou nosso silêncio, mas por dentro precisamos ter essa frase, “Isso está apenas parcialmente certo. Você está apenas parcialmente certo.” Este é o nosso sexto mantra
Este mantra podemos dizer em palavras ou temos que dizer para nós mesmos. Quando alguém vem e te elogia você tem que se lembrar de dizer esse mantra. “Você me elogia demais, mas você não vê todas as minhas fraquezas. Você só vê uma parte da verdade.” Você também pode dizer isso a essa pessoa, essa é a verdade. Porque se você é capaz de se aceitar, você tem paz.
Quando você é capaz de se aceitar, você tem a capacidade de aceitar os outros, é ótimo. Não exigirmos nada da outra pessoa, aceitemos como ela é. Mas ainda temos o desejo de que essa pessoa, com sua prática, possa desenvolver as coisas boas nela, e possa diminuir suas fraquezas. Mas esse desejo não é uma pressão ou crítica. Porque ao nos comportamos dessa maneira, percebemos que em nós temos os pontos positivos e negativos. Aceitamos ambos, os aspectos positivos e negativos e temos paz. Mas não há nada que nos impeça de ter um desejo de que com essa prática possamos aumentar os pontos bons e diminuir os pontos negativos.
Temos esse desejo para nós mesmos e também podemos ter o mesmo desejo para os outros, É por isso que antes que nós critiquemos uma irmã mais nova, temos que nos lembrar disso. Temos que aceitar essa pessoa primeiro, em vez de dizer "você é inútil", temos que dizer, "você tem muitas coisas boas, mas existem algumas fraquezas que eu gostaria que você praticasse para que essas fraquezas possam ser atenuadas.” Se você disser assim a outra pessoa ficará mais feliz, porque na sangha existem algumas pessoas que são muito frágeis, muito sensíveis, têm medo da luz.
Quando nos aceitamos, aceitamos as fraquezas dentro de nós e de repente temos paz. Quando olhamos para outra pessoa podemos aceitá-la facilmente. Olhamos para outra pessoa e a aceitamos. Em nossos olhos há uma luz de aceitação. Quando olhamos para alguém assim, eles ficam felizes. Mas se nós olhamos com olhos de escrutínio, ou crítica então aquela pessoa vai sofrer. É por isso que cada um de nós deve ter aquela luz de aceitação nos olhos. “Querido irmão, querida irmã, eu te aceito assim. Eu te aceito como você é.” Nossos olhos têm que brilhar essa luz de aceitação.
Mesmo que essa pessoa tenha fraquezas, e nós desejemos que essa pessoa seja capaz de transformá-las, temos que ser capazes de ver que essa pessoa também tem bons pontos. Não há ninguém que não tenha nenhum talento ou pontos positivos. Quando somos criticados por alguém, temos que nos basear nesse insight para ver que ele está parcialmente certo, apenas parcialmente certo. Ele não viu a outra parte de mim. Essa pessoa só vê uma parte de nós e não o todo em nós. Essa é a verdade: como você pode ver tudo da outra pessoa? Mesmo em nós não vemos isso. Como podemos ver na outra pessoa?
Se vivemos em uma comunidade, temos que ter essa humildade. Temos que ver que não temos um eu separado, somos continuações de nossos ancestrais. Todos os talentos, todos os méritos que temos, pensamos que são nossos de um eu separado. Todos são de nossos ancestrais transmitidos a nós, temos que ver isso. Temos que agradecer que nossos antepassados nos transmitiram as sementes de talentos e virtudes. Se temos um corpo que é saudável ou bonito não ficamos muito orgulhosos porque isso pertence aos antepassados, não é nosso. Se temos algumas fraquezas ou alguns maus hábitos, isso também vem dos ancestrais.
Não fique preso no conceito de self e fique com raiva de si mesmo. Por que sou assim? O importante é aceitar, temos que nos aceitar. Como eu disse aceitar-nos significa: não somos impotentes nessa posição, mas temos que ter aspiração para que nossa prática desenvolva nossos pontos positivos e com nossa prática possamos diminuir nossas fraquezas. Se somos capazes de agir assim conosco, poderemos começar a agir assim com as outras pessoas. Poderemos ver outras pessoas com olhos de aceitação.
“Querido irmão, querida irmã, eu te aceito como você é. Você é meu irmão, você é minha irmã.” A outra pessoa ficará feliz. Isso não significa que não tenhamos nenhum sonho ou desejo para essa pessoa. Temos que desejar a essa pessoa o mesmo que desejamos para nós mesmos, desenvolver as boas sementes e ser capaz de transformar alguns aspectos negativos dentro de si.
Este mantra que sugeri diz: “Você está parcialmente certo.” Quando nos elogiam isso está apenas parcialmente certo. Quando nos criticam, isso está apenas parcialmente certo, porque todos nós temos nossas fraquezas e nossos pontos fortes. Não deixe que os elogios ou críticas possam te causar sofrimento.
Quando elogiamos ou criticamos os outros temos que ter cuidado também. Apenas dizemos o nosso desejo, mas não criticamos ou elogiamos os outros. Não inflamos o ego da outra pessoa para que fique maior e não queremos que o nosso próprio ego fique maior.
(Palestra de Dharma de Thich Nhat Hanh em Plum Village – transcrito do vídeo do YouTube https://youtu.be/U6ypbV5hCL4)
Traduzido por Leonardo Dobbin)
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